Isenção de R$ 5.000? O ingresso grátis para um estádio quebrado!

O truque da isenção: a matemática da ilusão que esvazia seu bolso

O governo engorda, o povo estagna: a verdade por trás da isenção do IR

O imposto invisível que corrói sua renda: inflação, moeda fraca e a maquiagem do IR

A “grande novidade”, aumentar a faixa de isenção do imposto de renda. 

Imagine que você está numa escada rolante que desce. Você se esforça, sobe degrau por degrau, mas não sai do lugar; às vezes, dependendo da velocidade da esteira, até perde terreno. Essa é a sensação que milhões de brasileiros têm quando comparam o salário mínimo de 2016 ao de 2025. Em reais, houve um salto: de R$ 880 para R$ 1.518, um avanço de 72,5%. Parece vitória. Só que, do outro lado da moeda, a história é outra. Em 2016, o dólar custava em média R$ 3,49; em 2025, ronda R$ 5,69. Resultado: aquele salário de 2016 equivalia a cerca de US$ 252, e o de 2025 a uns US$ 267. Quase dez anos depois, um ganho de apenas 6% em dólares, e, no meio do caminho, especialmente em 2020 e 2021, o valor em dólar mergulhou pouco acima de US$ 200. Isso não é progresso!

Em 2025, já existia isenção até R$ 3.036 (o equivalente a dois salários mínimos). A Câmara aprovou elevar para R$ 5.000. Manchetes brotam: “Mais brasileiros livres do IR!”. Mas aqui está o truque: se você ganha dois salários mínimos, já não pagava IR há anos por causa do desconto simplificado e das regras vigentes. Se você ganha três ou quatro salários, pode até sentir algum alívio, mas nada disso muda o fato essencial de que o seu dinheiro vale menos. 

A isenção do IR funciona assim: uma notícia que parece presente, mas que não altera o que realmente importa, o quanto você leva para casa em coisas de verdade.

Por que essa estratégia é tão querida pelos políticos? 

Porque rende manchete. É rápida, fácil de comunicar, dá voto: “Mais brasileiros livres do imposto de renda”. 

Ser “isento” para levar menos não é benefício; é truque. 

Do mesmo modo, entrar no estádio de graça para assistir a um jogo ruim em cadeiras quebradas, pagando caríssimo pelo refrigerante, não é promoção; é engodo.

Os números, para não restarem dúvidas, contam a mesma história: salário mínimo de R$ 880 (≈ US$ 252) em 2016 contra R$ 1.518 (≈ US$ 267) em 2025; +72,5% em reais, apenas +6% em dólares. Arrecadação federal próxima de R$ 1,38 trilhão (≈ US$ 396 bi) em 2016 e de R$ 2,67 trilhões (≈ US$ 496 bi) em 2024. O governo ganhou musculatura em dólares; o trabalhador ficou quase no mesmo lugar. A verdade incômoda é esta: não é a tabela de imposto que protege o cidadão, é o poder de compra da moeda. Enquanto a discussão pública se contentar com manchetes de isenção, vamos seguir comemorando caixas cada vez maiores com menos conteúdo dentro, acreditando no truque, enquanto a vida real esvazia as sacolas no supermercado.

Arrecadação do governo em R$ e convertida em US$

2016: ~R$ 1,384 tri ≈ US$ 396,6 bi (câmbio médio 3,4901).

2024: ~R$ 2,679 tri ≈ US$ 497,1 bi (câmbio médio 5,3895).

Variação em US$ (2016→2024): +25,4% (governo engorda em moeda forte, enquanto o mínimo em US$ ficou praticamente no mesmo lugar).

Resultado objetivo: com a régua do dólar, o Estado cresce mais que o salário mínimo; com a régua do IPCA, o mínimo em R$ de 2024 cresce muito pouco ao longo da década (faixa R$ 1,32–1,45 mil em valores constantes), confirmando estagnação do poder de compra. Você sobe a escada rolante que desce!

De 2016 a 2025 o contracheque engordou 72,5% em reais, mas, na régua do mundo, virou só +5,8% em dólares. No buraco de 2020–2021, o seu salário em moeda forte desabou para pouco mais de US$ 200. Em 2024–2025 ele respira, porém segue abaixo de 2017. No mesmo período, o governo engorda +25,4% em dólares. A “isenção do IR” é o ingresso grátis para um estádio com cadeiras quebradas: a manchete é boa, o jogo é ruim. O que decide a sua vida não é a faixa da tabela, é o poder de compra da moeda.

Imagine-se subindo uma escada rolante que está descendo. Você se inclina para frente, respira fundo, faz força com as pernas, dá dez passos, vinte passos, o suor escorre. E, no final, quando olha para o lado, percebe que está praticamente no mesmo lugar. Essa é a metáfora perfeita para o que aconteceu com o trabalhador brasileiro de 2016 a 2025. Aparentemente houve avanço, afinal, o salário mínimo saiu de R$ 880 para R$ 1.518, uma alta de 72,5%. Visto só no número, parece vitória. Mas quando colocamos esse valor na régua que realmente importa, a régua do poder de compra, vemos que o esforço foi quase em vão.

Em 2016, o dólar custava em média R$ 3,49. O mínimo daquele ano equivalia a US$ 252. Já em 2025, com o câmbio em R$ 5,69, os mesmos R$ 1.518 viram apenas US$ 267. Nove anos, muito suor, muito imposto pago, e o ganho efetivo é de meros 6% em moeda forte. E ainda assim, no meio do caminho, em 2020 e 2021, houve um mergulho brutal: o salário em dólar caiu para pouco acima de US$ 200, a pior marca da década. Quem viveu esse período lembra bem do peso da sacola de supermercado encolhendo semana após semana. O que se chama de progresso, no fundo, foi só sobrevivência.

Enquanto os números do contracheque cresciam, os preços corriam ainda mais rápido. O frango, que custava R$ 6 o quilo em 2016, já passou de R$ 12 em muitos mercados em 2025. O gás de cozinha, que rondava R$ 50, dobrou e beira R$ 110. A conta de luz, pressionada por bandeiras tarifárias, virou um tormento. Aluguel, transporte, saúde — tudo avançou em ritmo mais veloz. O salário aumentou no papel, mas o mundo real correu na frente. É como se você recebesse uma caixa maior de presente. Embalagem vistosa, fita brilhante. Mas, quando abre, percebe que metade dos brinquedos sumiu. O volume engana: a substância se perdeu.

E aí vem a “grande novidade”: a faixa de isenção do imposto de renda. Em 2025, a regra já previa isenção até R$ 3.036, o equivalente a dois salários mínimos. A Câmara aprovou elevar para R$ 5.000. Manchetes estampam: “Histórica vitória! Mais brasileiros livres do IR!”. Mas aqui está o truque: quem ganha dois salários já não pagava imposto. Quem ganha três ou quatro até sente alívio, mas nada disso muda o fato brutal de que a moeda compra menos. É como entrar de graça num estádio com cadeiras quebradas, comida cara e um jogo ruim. Você deixou de pagar ingresso, mas continua saindo derrotado.

A matemática é cristalina. Em 2016: R$ 880 ÷ R$ 3,49 = US$ 252. Em 2025: R$ 1.518 ÷ R$ 5,69 = US$ 267. Em dez anos, praticamente no mesmo ponto. E é em dólares, ou em termos de bens e serviços que têm preço global, que se mede o real valor do dinheiro: combustíveis, insumos, medicamentos, maquinário. A régua internacional mostra a nudez: não houve salto. Houve estagnação. Quer uma metáfora mais popular? Em 2016, seu salário comprava um saco com 100 laranjas. Em 2025, com “mais dinheiro”, o saco vem com 80. O governo então sorri e diz: “Agora você não paga imposto para levar esse saco de 80 laranjas”. O problema nunca foi o ingresso da feira. O problema é que as frutas sumiram.

Agora, olhe para o caixa registrador do outro lado do balcão: o governo. Em 2016, a receita federal foi de R$ 1,38 trilhão. Com o câmbio médio daquele ano, isso dá US$ 396 bilhões. Em 2024, a arrecadação chegou a R$ 2,67 trilhões. Convertida pelo câmbio médio de R$ 5,38, equivale a US$ 497 bilhões. Em dólares, portanto, a arrecadação cresceu 25% entre 2016 e 2024. O trabalhador ganhou 6% em quase dez anos. O Estado engordou 25% em oito anos. E, pasme, mesmo assim fechou 2024 com déficit de 0,09% do PIB. Uma geladeira furada: você coloca, e vaza.

Essa é a engrenagem: para manter a máquina, o governo tem duas armas. A primeira é o imposto direto, como o IR. A segunda, mais sutil e mais cruel, é a inflação. Ela funciona como um imposto invisível: você não vê a alíquota, mas sente o efeito toda vez que o carrinho de supermercado encolhe. O valor real do que você ganha derrete sem que precise passar pela mão de um fiscal da Receita. 

Você tem mais dinheiro no bolso, mas a alegria foi anulada. É isso que acontece com a isenção: ela é o aumento do salário sem o aumento do poder de compra.

Por que então os políticos adoram esse truque? Porque dá manchete. “Maior isenção da história”. “Mais de X milhões de brasileiros livres do IR”. Fácil de comunicar, fácil de vender em campanha. A luta verdadeira, inflação baixa, moeda estável, produtividade em alta, disciplina fiscal, reformas estruturais, é lenta, árida, impopular. Não vira meme, não estampa capa. Por isso preferem a maquiagem.

Se o real tivesse preservado a força de 2016, o salário mínimo de 2025 estaria na casa de US$ 320 a US$ 350. Isso significaria geladeira mais cheia, tanque abastecido, aluguel pago e ainda sobra. Mas estamos estacionados em torno de US$ 260. A década inteira virou uma esteira: muito suor, pouco avanço. Anunciar isenção de R$ 5.000 nesse cenário é como trocar o rótulo da caixa: impressão boa, conteúdo vazio.

Olhe de novo a arrecadação. Em reais, os números assustam: de R$ 1,38 trilhão para R$ 2,67 trilhões. Parece que o Estado dobrou. Mas, em dólares, o ganho é menor. Em 2016: US$ 396 bi. Em 2024: US$ 497 bi. Crescimento de 25%. Ainda assim, maior que o do salário em dólar. Ou seja, o Estado ficou mais robusto em moeda forte, o cidadão quase não saiu do lugar. E mesmo com essa “gordura”, o déficit continua. Isso significa mais impostos amanhã, mais inflação disfarçada, mais dívida a rolar. O cidadão paga duas vezes: na boca do caixa e no caixa do mercado.

Essa é a pinça. De um lado, a mão visível do imposto. Do outro, a mão invisível da inflação. Ambas apertam o trabalhador. A isenção é um tapinha nas costas, uma aspirina para quem tem hemorragia.

Não se impressione com rótulos. Pergunte sempre: “O que esse dinheiro compra?”. Quantos quilos de carne, quantos litros de leite, quantos botijões de gás, quantos meses de aluguel cabem no meu salário? Em 2016, com R$ 880, você levava mais do que hoje com R$ 1.518. A embalagem cresceu, o selo dourado de “isenção histórica” brilha, mas o recheio encolheu.

Ser “isento” para levar menos não é benefício. É truque. Entrar no estádio de graça para assistir a um jogo ruim em cadeiras quebradas, pagando caro no refrigerante, não é promoção. É engodo.

E os números falam por si: salário mínimo de R$ 880 (≈ US$ 252) em 2016 contra R$ 1.518 (≈ US$ 267) em 2025. Crescimento de 72,5% em reais, só 6% em dólares. Arrecadação federal: R$ 1,38 tri (≈ US$ 396 bi) em 2016 contra R$ 2,67 tri (≈ US$ 497 bi) em 2024. O governo cresceu 25% em dólares, o trabalhador quase parou.

A verdade incômoda é esta: não é a tabela de imposto que protege o cidadão. É o poder de compra da moeda. Enquanto aceitarmos manchetes como vitória, continuaremos celebrando caixas maiores com menos conteúdo, embalagens vistosas cheias de ar, acreditando no truque, enquanto a vida real continua esvaziando nossas sacolas de supermercado.